O
envelhecimento tem tomado cada dia mais os debates, os noticiários, as rodas de
conversa. Mas o que me chama mais a atenção é que o debate se faz em torno de
uma pergunta: como não demonstrar o envelhecimento e parecer sempre jovem?
Pensa-se muito na estética, na beleza de um corpo que não é eterno e esquece-se
do mais importante, a saúde.
Envelhecer
não é sinônimo de adoecer. Nem todo idoso é uma pessoa portadora de alguma doença,
mas o que é comum e natural é que este indivíduo perca algumas habilidades e
comece a se adaptar da melhor maneira a essa nova fase da sua vida. E muitas
vezes nós os consideramos como doentes ou impossibilitados na realização das
tarefas (por mais simples que sejam). É esse ponto que eu gostaria de abordar,
falar de fragilidade, deficiência e envelhecimento e como a sociedade enxerga
esses fenômenos.
Muitas
vezes por considerarmos a deficiência pelo modelo médico, cometemos o erro de
caracteriza-la como doença ou limitação física, considerando aí apenas as
desvantagens funcionais do indivíduo e suas limitações corporais; entretanto,
em 1960, surgiu no Reino Unido uma nova visão para conceituar a deficiência
como sendo um problema social, sendo assim, transfere-se a responsabilidade
para a incapacidade da sociedade em prever e se ajustar-se a diversidade.
Portanto,
deficiência é definida como: “desvantagem ou restrição de atividade provocada
pela organização social contemporânea que pouco ou nada considera aqueles que
possuem lesões físicas e os exclui das principais atividades da vida social”
(Upias, 1976, p. 3-4).
A
intenção do debate era destacar que não havia, necessariamente, relação direta
entre lesão e deficiência; onde lesão seria uma característica corporal, como o
sexo e a cor da pele, ao passo que deficiência seria o resultado da opressão e
da discriminação sofrida pelas pessoas em razão de uma sociedade que se
organiza de uma maneira que não permite inclui-las na vida cotidiana. Podemos
exemplificar: não poder caminhar é a expressão da lesão, a deficiência consiste
na inacessibilidade imposta às pessoas que usam cadeira de rodas.
Em
síntese, o modelo médico identifica a pessoa deficiente como algum tipo de
inadequação para a sociedade; o modelo social, por sua vez, inverte o argumento
e identifica a deficiência na inadequação da sociedade para a inclusão de todos
sem exceção.
Muitas das doenças
são entendidas como situações temporárias. Assim, embora pessoas doentes possam
doentes tenham uma condição de saúde inferior à determinada por algum critério
de normalidade, elas podem não ser consideradas deficientes dentro do modelo
médico porque sua redução de capacidades é apenas temporária e não permite
definir uma identidade. O caminho inverso também é trilhado para separar
deficiência de doença, porém com um argumento um pouco mais sofisticado: se a
deficiência é uma situação irreversível, é perfeitamente possível redefinir o
conceito de normalidade a fim de ajustá-lo à condição permanente das pessoas. A
cegueira, por exemplo, passa a ser a condição normal de uma pessoa cega e,
portanto, não faz sentido classificá-la como doente. Nesse esquema, uma pessoa que
não pode enxergar porque está com uma inflamação ocular grave é uma pessoa doente
e uma pessoa cega é uma pessoa deficiente.
Segundo Oliver
(1990, p. xiv), “todos os deficientes experimentam a deficiência como uma
restrição social, não importando se essas restrições ocorrem em consequência de
ambientes inacessíveis, de noções questionáveis de inteligência e competência
social, se da inabilidade da população em geral de utilizar a linguagem de
sinais, se pela falta de material em braile ou se pelas atitudes públicas hostis
das pessoas que não têm lesões visíveis”.
O
ato de revelar a relação entre envelhecimento e deficiência é importante por várias
razões:
1. Indica que o envelhecimento vem acompanhado de
algumas limitações nas capacidades físicas e, às vezes, intelectuais; no
entanto, apesar do envelhecimento crescente de quase todas as populações do
mundo, na maioria delas pouco ou nada se tem feito para que essas limitações
não se tornem causa de deficiências;
2. Mostra que, na ausência de mudanças na forma como as
sociedades organizam seu cotidiano, todos seguem em direção a uma fase da vida
em que se tornarão deficientes, o que motiva, ainda que por meio da defesa de
interesses egoístas, a melhoria das políticas públicas voltadas à deficiência;
3. Lembra que a interdependência e o cuidado não são
algo necessário apenas diante de situações excepcionais e sim necessidades
ordinárias em vários momentos da vida de todas as pessoas;
4.
Afirma que a previsibilidade do envelhecimento
permite entender que muito da deficiência é resultado de um contexto social e
econômico que se reproduz no tempo, pois a deficiência no envelhecimento é, em
parte, a expressão de desigualdades surgidas no passado e que são mantidas.
Do ponto de
vista conceitual, o modelo social enfatiza uma mudança de perspectiva quanto ao
peso que características corporais têm na experiência da deficiência, mudança
que tem consequências para a formulação de políticas: o reconhecimento da “sociedade
deficiente” é tão ou mais importante para a formulação de políticas públicas que
a identificação da “pessoa deficiente”. O modelo social jamais ignorou o papel que
as perdas de funcionalidade têm na experiência da deficiência, mas enfatiza que,
em muitos casos, essa experiência só ocorre por motivos eminentemente sociais. É
perfeitamente possível, por exemplo, que, em uma sociedade devidamente
ajustada, uma pessoa com algum tipo de limitação funcional não experimente a
deficiência.
De modo geral se
faz importante a partir dessa nova conceituação que os governos e a sociedade de
por completo, passe a entender que o envelhecimento e a deficiência, mesmo que
fenômenos diferentes, precisam ser considerados de uma perspectiva mais ampla,
fazendo com que os indivíduos idosos e portadores de deficiência sejam realmente incluídos na sociedade para que contribuam
e desfrutem de maneira mais igualitária e respeitosa, deixando assim de sermos uma sociedade despreparada e deficiente.
Luan César Simões
Fisioterapeuta
Resumo baseado no texto: A nova maneira de se entender a deficiência e o envelhecimento
(MEDEIROS, DINIZ, 2004).